Registo
Foto Exigem-se mudanças na lei para animais de companhia

O jornal Sol publicou hoje uma notícia que espelha bem a necessidade de mudar as leis para os animais de companhia. Os maus tratos e abandono de animais de companhia são o “pão-nosso de cada dia” para veterinários e associações de defesa dos seus direitos. Esperava-se que a solução passasse pela nova proposta do Código do Animal de Companhia apresentada há algumas semanas atrás, no entanto, esta revelou ser mais uma regressão do que uma solução para o problema.

A criminalização dos maus tratos e do abandono era, aliás, uma das questões “prioritárias” a serem resolvidas por uma nova legislação, defende a bastonária da Ordem dos Veterinários. Laurentina Pedroso esperava que o novo Código “melhorasse de facto as condições de bem-estar dos animais”. Mas os problemas e omissões da lei continuam por resolver, alertam a bastonária e activistas.

Câmaras recebem queixas todos os dias

Em Sintra, Alexandra Pereira, a veterinária municipal conta ao SOL que “todos os dias há situações de abuso” que são denunciadas. Mas os profissionais da Câmara pouco podem fazer. “Não tenho lei que me dê margem para intervir”, explica a veterinária, acrescentando que “é comum haver pessoas que deixam os cães o dia inteiro fechados em varandas exíguas, sem protecção e sem alimento”.

A falta de educação no que toca ao tratamento dos animais (muito por culpa de como a lei os vê) vai desde os particulares até aqueles que fazem negócio com eles – os chamados “criadeiros”. Isto expressasse não só no aumento da taxa de abandono como no aumento do número de animais que dá entrada nos canis municipais. Por exemplo, o canil de Sintra recebe por ano cerca de três mil animais. “O mais frustrante”, confessa Alexandra Pereira, “é reabilitar um animal e, no caso de ter chip, sermos obrigados a devolvê-lo ao dono que o abandonou ou maltratou”.

Coimas aplicadas compensam

Segundo a lei, no pior dos cenários, os autores deste tipo de maus tratos são sujeitos a uma multa mínima de 500 euros. Daí que “compense aos donos pagar as multas”, sublinha a bastonária Laurentina Pedroso: “Muitas vezes, os 500 euros já estão previstos na contabilização e o negócio continua a ser rentável. Nada os inibe de continuar a fazer o mesmo”.

“Em qualquer país civilizado, os maus tratos a animais podem ser punidos com penas de prisão. Portugal é dos poucos países em que não existe criminalização destes actos”, sublinha a bastonária, que defende alterações ao Código Civil e ao Código Penal que classifiquem os animais como “seres sencientes” (que sentem dor).

Condições para manter animais não estão asseguradas

“A questão não está no número de animais em casa. Há pessoas que não devem ter sequer um” - insiste Laurentina Pedroso, considerando que a lei deve antes “acautelar as condições em que os animais são mantidos” e os antecedentes dos donos. 

Olinda Dias, que trabalha em direitos dos animais há mais de 15 anos, conhece “demasiado bem” as condições a que, por vezes, são sujeitos cães e gatos. Há alguns anos, a activista deparou-se com um cenário “horrível” quando abriu a porta de uma vivenda, na zona de Torres Vedras. Mais de 60 cães sobreviviam sozinhos, fechados, entre fezes, urina e restos mortais dos companheiros que ainda não tinham devorado. “A casa tinha sido abandonada pelos donos há anos e os cães, famintos, alimentavam-se uns dos outros. Também se reproduziam e, enquanto as cadelas pariam, os outros cães esperavam para comer os recém-nascidos”, lembra.

Maria do Céu Sampaio, a responsável da Liga Portuguesa dos Direitos do Animal (LPDA) defende que o dinheiro das licenças para ter um cão - o único animal para o qual são exigidas - deve ser investido em campanhas de esterilização: “Há, como é óbvio, muitas pessoas em situação ilegal, simplesmente porque não têm dinheiro. Aliás, temos cada vez mais situações em que damos comida aos animais para que os donos consigam mantê-los”.

Queixas de vizinhos

Só até Junho, a GNR recebeu 578 denúncias por falta de higiene e ruído causado por animais de companhia. Em 2012, foram 978. Os números ficam, porém, muito aquém da realidade, uma vez que a maioria das queixas é feita em centros urbanos, da responsabilidade da PSP, que não tem esta contabilização.

Mas a maioria não se confirma. “São vizinhos que se querem vingar ou apenas chatear os outros”, conta a veterinária Alexandra Pereira, de Sintra. E, nos casos em que se confirmam as queixas de insalubridade (devido a maus cheiros) e de ruído (“muitas vezes ligadas a maus tratos”), é “raro” os processos terem andamento. “A maioria dos que encaminhamos para a Direcção-geral de Alimentação e Veterinária não tem tramitação”, lamenta a veterinária municipal.

Fonte: SOL