Registo
Foto Fomos conhecer o Canil dos Boxers D'Anteikan

No fim-de-semana passado realizou-se a 30ª Monográfica do Boxer em Barcelos, onde foi atribuído o prémio de melhor grupo criador ao Paulo Fernandes, detentor do Afixo Anteikan. O Paulo tem 43 anos, tem um canil familiar com três cães, de três gerações: a Dai de Cyberbox, a Bat D´Anteikan e a Evita D´Anteikan. Apesar de ser uma pessoa super ocupada que se divide entre a sua profissão de enfermeiro e o seu part-time de criador, lá arranjou umas horas para falar connosco. O Doglink foi até Setúbal dar-lhe os parabéns e conhecer de perto o seu trabalho.

Doglink: Olá Paulo, antes de mais parabéns pelos resultados obtidos na Monográfica do Boxer, principalmente pelo troféu de Melhor Grupo Criador. Imaginamos que é um grande orgulho para si!

Paulo: Ora essa, trata-me por tu!

Então para começar: porque é que escolheste a raça Boxer para fazer criação?

Bem eu sempre gostei de cães mas a paixão pela raça aconteceu por acaso quando ainda era teenager. Um casal de amigos, muito chegado a mim, tinha uma Boxer que era extremamente meiga e brincalhona e percebi que havia ali qualquer coisa de especial que se identificou logo comigo.

E nessa altura já pensavas em criação?

Sim, foi nessa altura que o “bichinho” da criação surgiu, mas por viver em apartamento fiquei sempre limitado. Mas disse: um dia que passar para uma moradia, vou comprar um casal de Boxers e fazer criação! Até então, longe de saber o trabalho que isso dava.

Deixa-me adivinhar: foi mudar de casa e começar a fazer criação, ou não?

Claro! Eu já estava com aquela fisgada! Mal mudei fui logo procurar um casal de Boxers, mas esta história não é muito feliz…

Então?

Bem, comecei a minha procura pelo jornal e lá comprei o meu casal de Boxers em dois anúncios diferentes. Quando os cães começaram a crescer apercebi-me que havia qualquer coisa que não estava bem. O macho tinha um focinho super comprido e estava bem longe do aceitável pelo estalão. A fêmea não crescia e tinha problemas respiratórios. Reparem que, ambos os cães tinham pedigree e, um deles, até era neto de multicampeões, segundo o “criador”. Eu era inexperiente e achei tudo muito estranho… até que resolvi contactar o Boxer Clube de Portugal (BCP). Um dos elementos da Direcção da altura do BCP o Elias, do afixo Cyberbox, foi avaliar os meus cães e dar-me a triste (mas sincera) notícia de que nenhum dos meus cães se enquadrava minimamente no estalão do Boxer.

E como é que conheceste um verdadeiro Boxer?

Nesse mesmo dia! O Elias apresentou-me o Nox do Sul. Adorei o cão e fiquei de imediato muito interessado na criação dele. No entanto, ele não tinha nenhuma ninhada de momento, mas, ainda assim, aconselhou-me a escolher a linha com que mais me identificava. Mandou-me vários sites de canis famosos; na altura, os que me impressionaram mais foram: Colle del Infinito, di Soragna, Val D’Europe e Cavalieri del Monferrato.

Esses foram os teus canis de referência?

Sim, pode-se dizer que sim. Embora tudo fosse uma novidade para mim, eu tinha de ter uma referência!

Pensaste ir comprar um boxer ao estrangeiro?

Houve alturas em que pensei nisso; estive quase a comprar uma fêmea italiana mas realmente nunca se proporcionou. Entretanto, o Elias teve uma ninhada onde nasceu uma única fêmea, a Dai de Cyberbox. Apesar de ter pouca marcação de branco e de, em exposição, poder vir a ser penalizada por isso, decidi arriscar. Tinha de começar por algum lado!

Mas é assim tão importante ter branco?

Os juízes, às vezes, dão preferência aos exemplares com marcação a branco porque são vistosos, mas os cães sólidos têm iguais qualidades quer para exposição quer para criação. É uma questão de gosto pessoal. Misturamos muito criação com exposição. Queremos “exemplares bonitos” a criar “exemplares bons”, mas às vezes não é bem assim. Exposição é uma coisa e criação é outra. Embora o ideal é juntar as duas. Mas é mais complicado do que pensamos… muito complicado. Nem sempre cães campeões deram filhos campeões. O gene Campeão não existe!

Mas antes de passarmos para coisas mais complicadas… O teu afixo está relacionado com a forma com que crias?

Sem dúvida! Anteikan é a palavra japonesa para casa (kan) de equilíbrio ou estabilidade (antei). A minha motivação foi sempre criar para melhor, mantendo sempre um equilíbrio quer em casa quer na exposição. Em casa tenho a Bat, mas preciso também de a ter em exposição. O problema das minhas cadelas de exposição, a Dai e, agora, a Bat, foi estarem a fazer o campeonato e terem de parar para fazer uma ninhada. A primeira ninhada da Dai foi quase aos quatro anos! É importante parar de vez em quando para se poder criar bons cães para o futuro. Não interessa criar em série mas sim criar em qualidade.

Equilíbrio mantendo sempre qualidade, certo?

Claro! Passo horas a pensar quais os cães que vou cruzar. Pego num grupo de machos dentro das linhas que pretendo e depois vou seleccionando os que têm características que mais me interessam. Na maior parte das vezes, acabo sem nenhuma opção e tenho que voltar ao início.

E quais são as tuas preocupações enquanto escolhes um cão?

Acima de tudo é saber quais são as características menos boas e que queremos corrigir da cadela. Primeiro que tudo para se criar bem é preciso saber o que temos em casa! Isto é importante para que eu possa seleccionar um macho que transmita à descendência características que quero corrigir. Se alguém me perguntar o que é que eu pretendo corrigir numa das minhas cadelas, eu sei bem. Por outro lado, o desafio está em manter as qualidades de cada uma. Isto é que é o fundamento da criação para mim: dentro das minhas linhas, não mexer naquilo que está bom, mas corrigir aquilo que está menos bom trazendo sempre algo de excelente. Não existe o cão perfeito, mas é para isso que trabalho. No entanto, não nos podemos esquecer de um factor: a genética! O emparelhamento dos genes, o fenótipo é algo que não controlamos. Não nos podemos esquecer que “o todo não é igual à soma das suas partes”.

O teu espectro da selecção resume-se a Portugal?

O meu espectro é global, selecciono um grupo de cães que eu acho interessante e que me chamam a atenção. Depois vou vendo as linhas, as combinações, as características menos boas ou as qualidades que têm, o que passam e o que não passam para os filhos. Muitas vezes há cães espetaculares que marcam pouca coisa nos filhos e, fazer uma ninhada assim, é fazer uma ninhada para número.

Tens agora uma filha da Bat, a Evita. Achas que ela se poderá tornar como a mãe?

A Evita é uma óptima cadela, o problema é que ela tem pouco branco. Ainda este fim-de-semana, na Monográfica, o juiz disse-me: “ ela tem uma estrutura 5 estrelas, boas angulações, boa cabeça e um bocadinho de prognatismo que é corrigível com um macho…” mas não tem branco. Por isso, acho que ela vai ser melhor cadela de reprodução que de exposição. Ser como a mãe, algo difícil! Bat só existe uma e tal como disse tudo depende do emparelhamento dos genes…

De momento tens três cadelas, elas roubam-te muito tempo?

Perco cerca de 1 hora a 1 hora e meia por dia, é como se fosse o meu treino. Claro que convivo e brinco com elas cá em casa. Mas lá fora é essencialmente treino físico e treino de exposição.

E as ninhadas exigem-te muito de ti?

Sim, claro. Quando comecei não tinha qualquer noção do que era ter uma ninhada. Na minha primeira ninhada, quando cheguei a casa, já a Hangie tinha feito o trabalho todo, fiquei impressionadíssimo! Em cada ninhada que se seguiu fui aprendendo aos poucos. Houve sempre um criador ou criadora mais chegado que me apoiava. Mas também tive muitas complicações de parto em algumas delas. Hoje em dia, a experiência é outra e a tranquilidade também, mas ainda assim precisam de muita atenção.

E qual foi a sensação de ganhar o melhor criador de Boxers de 2013?

Não é bem assim, eu ganhei apenas o troféu de Melhor Grupo Criador na Monográfica Nacional, que é a exposição mais importante do ano no país, mas também há o campeonato! Mas sim, foi importante e demonstra uma grande valorização percebermos que realmente estamos a fazer um trabalho coerente. Acima de tudo houve uniformidade no grupo que apresentei (Bat, Elektra e Evita) e isso significa que o meu trabalho está num patamar alto e é uniforme.

O teu nome já é conhecido, tens tido mais pessoas a procurarem cães da tua criação?

Não. Aparecem muitas pessoas interessadas, mas procuram primeiro preço e só depois qualidade. Uma coisa é certa, eu só cedo um exemplar a quem eu acho que tenho que ceder, sejam criadores ou particulares! Mas gosto sempre de conversar com as pessoas para saber a quem é que estou a entregar os meus cães. Gosto de ver para onde vão, as condições que irão ter, mas claro, não se consegue controlar tudo!

E o futuro?

O futuro passa por manter a fasquia de qualidade de criação que já atingi e tentar fazer melhor ainda. Grande desafio!

Só gostas de Boxers tigrados?

Bem eu gosto muito de tigrados, mas sempre quis ter cães fulvos filhos da Hangie para expor. Vou trazer do Campeonato do Mundo uma cadela fulva em co-propriedade, apresentá-la em exposições e, quando ela tiver idade fazer criação, dar continuidade ao meu trabalho também nessa categoria.

E que conselhos é que darias a uma pessoa que quisesse comprar um Boxer?

O primeiro conselho é que qualquer um que queira comprar um Boxer saiba o que é que é um Boxer! É necessário ler sobre a raça e, mais do que isso, ir visitar criadores. Não se acanhem, vão a canis, a exposições! Para além disso, analisem bem o pedigree do cachorro. Eu sempre ouvi os meus pais dizerem que “o barato sai caro”! Independentemente da utilização do cão (exposição ou companhia), é importante procurar num sítio que nos dê o máximo de “garantias”. Podem e devem pedir os exames de saúde, ver os pais, questionar… Não adquiram à toa! Não se agarrem a uma ninhada! Não procurem em jornais...

Boa sorte para o campeonato do Mundo e para a Atibox!

Obrigado, vamos lá ver!