No mundo dos cães, os donos têm por vezes uma visão pouco abrangente, vendo o mundo apenas na perspectiva do seu cão ou da sua própria experiência de treino. Assim, pronunciam certas afirmações como se fossem verdades absolutas. Dizem certas e determinadas coisas que, no mundo ideal, nunca deveriam ser pronunciadas, tornando-se essas pequenas opiniões ou “certezas” o culminar de problemas de ordem maior ou pequenas situações que se podem vir a tornar num grande problema.

Ninguém é perfeito, e afirmar “eu nunca irei dizer...” é uma aspiração quase impossível. Ainda assim, se for apanhado a dizer alguma destas frases é altura de repensar a sua estratégia de treino e de avaliar realmente o comportamento do seu cão.

1. “Eles que são cães, que se entendam”

Isto é uma daquelas frases que um dono consciente e responsável nunca diz. Esta afirmação surge por muitos donos considerarem que os cães devem formar e encontrar o seu lugar na matilha “do bairro”quando estão em contacto com os da mesma espécie, e por isso os humanos não precisam de intervir nas suas interacções sociais. Muitos comportamentalistas e treinadores não só alertam para este pressuposto erróneo como também reforçam que todos os cães são indivíduos e enquanto que uns sabe como dar ou receber sinais, outros não.

Alguns cães são bullies, outros medrosos. Alguns têm dificuldades em receber sinais, outros ignoram-nos. Alguns ficam demasiado excitados quando brincam, outros tornam-se presas fugitivas. Alguns são demasiado possessivos... Isto tudo para dizer que cada cão é único e deve-se evitar colocar diferentes personalidades num mesmo espaço sem supervisão humana.

A treinadora Erin Kramer avisa que é importante deixar que os cães se descubram até certo ponto. “É importante que o cão aprenda com outros que há mordidas de brincadeira e outras a sério ou que está a ser demasiado insistente ou bruto. Mas se a situação escalar sem qualquer intervenção humana, o cão só irá aprender duas coisas. Primeiro: ‘não posso contar com o meu dono para me defender’. Segundo: ‘Se eu lutar o perigo desaparece (por isso vou lutar das próximas vezes)’ ou ‘Detesto os outros cães, são assustadores’.” Lembre-se que não o levou ao parque para que ele começasse a pensar assim.

Um dono responsável não espera que as coisas se resolvam por elas próprias. Ao invés, ajuda o cão a ter interacções sociais positivas gerindo as brincadeiras e assegurando que está tudo calmo. Se alguma situação menos positiva emergir, o dono deve intervir imediatamente e nunca se desresponsabilizar pelo comportamento do seu cão.

2. “O meu cão nunca morderia”

O seu cão pode ser o cão mais simpático do mundo, mas “Nunca diga nunca”. Quando diz que o seu cão nunca morderia ninguém é basicamente um sinal de alerta para uma falta de conhecimento (ou mesmo negação) acerca do comportamento do seu cão.

Se o seu cão tem boca e interage com o que se passa à sua volta, então ele poderá morder caso se sinta provocado. Em vez de pressupor algo tão forte, é melhor ter isto em consideração e respeitar sempre as capacidades, as zonas de conforto e os limites do seu cão.

Até os cães mais bem treinados mordem:

3. “Não é culpa do meu cão”

Talvez não seja, talvez seja... Há sempre o cão que leva com as culpas, ou por ser o maior ou o mais barulhento ou por ser de uma determinada raça. No entanto, uma grande parte dos donos diz de boca cheia: “a culpa não é do meu cão!”.

Esta frase é normalmente dita por pessoas que têm pouca experiência em ler ou interpretar a linguagem corporal dos cães ou que não estão a prestar atenção aos sinais que o seu cão está a enviar ao mundo.

Os cães pequenos são um bom exemplo disso. Por serem pequenos, muitos donos julgam que é aceitável – ou pior, engraçado! – os cães rosnarem, ladrarem ou até se armarem para cima de outros cães. Os donos acabam facilmente com a briga pegando ao colo ou dando um pequeno puxão à trela... e na maioria das vezes argumentam que foi culpa do cão maior, ainda que na verdade tenha sido o animal pequeno a começar.

Se o seu cão costuma estar envolvido em sarilhos, começe a prestar mais atenção, pois pode ser ele a causa dos problemas.

4. “Não há problema, ele não faz mal”

Isto é normalmente dito em situações em que o cão se aproxima de outro cão ou pessoa. O dono fá-lo para acalmar potenciais medos, pois o outro dono ou o cão parecem nervosos. Por vezes, há donos que dizem esta frase sem nem sequer terem controlo sobre a maneira como os seus cães abordam outros e, no fundo, só esperam que tudo corra bem.

Esta é também uma frase normalmente dita por donos cujos cães querem abordar outros e os seus donos pedem para manter uma certa distância. De facto, não interessa se o seu cão é amigável ou não, quando alguém lhe pede para manter distância, você deve respeitá-lo. O cão em causa pode ser muito medroso, reactivo, estar aleijado, a ser treinado ou simplesmente não querer nada com o seu cão!

Só porque o seu cão é amigável não significa que ele possa andar por aí a abordar outros cães e pessoas. Além disso, o facto de ele nunca ter mordido ou nunca ter armado confusões não dá direito a "livre trânsito".

5. “Ele só quer brincar”

Esta frase é frequentemente dita por donos cujos cães brincam de forma exuberante fazendo bullying ou que passam a barreira do socialmente aceitável no mundo canino. Geralmente, quem o diz não sabe o suficiente acerca de linguagem corporal canina para conseguir compreender que o outro cão está farto da brincadeira, ou que o seu cão não está de modo algum a brincar.

Talvez o cão que "quer brincar" esteja demasiado nervoso e mostre estar demasiado submisso lambendo o outro cão ou metendo-se de barriga para cima. Talvez o cão que "quer brincar" dê pequenas mordidelas, esteja a ladrar ou a olhar de forma intensa para o "parceiro de brincadeira" enquanto este demonstra sinais de frustração ou medo.

Se diz que o seu cão "só quer brincar", quando este demonstra comportamento agressivos, irritantes ou constrangedores, está na hora de estudar melhor a linguagem canina e descobrir o que realmente se está a passar.

Adaptado de: Mother Nature Network